⚙️ O Hotbit — o sonho em preto, cinza e azul
O Hotbit HB-8000, fruto da parceria Sharp/Milmar, era o ápice da microinformática nacional dos anos 80.
Baseado no processador Zilog Z80A de 3,58 MHz, com 16 ou 64 KB de RAM, rodava o padrão MSX 1.0, criado pela Microsoft e pela ASCII japonesa.
Suas principais características:
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Teclado integrado com teclas mecânicas de viagem longa (luxo da época)
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Cartuchos para jogos e aplicativos — como o lendário Nemesis ou Knightmare
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Interface de fita cassete e saída de vídeo composto, ideal para TVs domésticas
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MSX BASIC, interpretador embutido que transformava qualquer curioso em aprendiz de programador
Era a ponte entre o videogame e o computador.
Você podia jogar pela manhã e programar à tarde — desde que ninguém quisesse ver a novela.
🧠 A semente do programador
Aquela tarde em Quiririm foi o ponto de ignição.
O barulho da fita K7 carregando, o “beep” do programa iniciando, o cheiro de poeira no tubo da TV — tudo ficou gravado em mim.
Anos depois, quando tive meu TK-85, aquele pequeno 8 bits que roubava o televisor da sala, eu já sabia: queria viver nesse universo.
E de lá, um salto natural me levou para o outro extremo — o IBM Mainframe.
🏢 O salto para o gigante — o MVS/360
Enquanto eu digitava minhas primeiras linhas em BASIC, o mundo corporativo vibrava em outra frequência.
Nos longínquos anos 1980, o IBM System/360 já era lenda viva — uma arquitetura modular lançada em 1964 que mudou para sempre o conceito de computação empresarial.
Rodava o sistema MVS (Multiple Virtual Storage), herdeiro do OS/360, e foi o primeiro a introduzir a ideia de compatibilidade entre gerações de máquinas — um verdadeiro milagre de engenharia.
O MVS/370 e seus descendentes moviam bancos, governos e indústrias enquanto nós, os garotos do Hotbit e TK-85, brincávamos de lógica em 8 bits.
Do lado de cá, o som era de fita K7.
Do lado de lá, o som era de fita magnética de 9 trilhas rodando a 75 polegadas por segundo.
E o mais curioso?
Ambos — o menino no quarto e o operador no CPD — falavam a mesma língua: o código.
BASIC ou COBOL, MSX ou MVS, pouco importava.
Era tudo a mesma busca: dizer à máquina o que fazer e se encantar quando ela obedecia.
💡 Easter Eggs e curiosidades
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O MSX BASIC do Hotbit foi desenvolvido pela Microsoft, e seu código-fonte serviu de base para versões posteriores usadas em máquinas japonesas.
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O Hotbit vinha com saída RF — ou seja, ligava direto na TV, ocupando o “canal 3”, o mesmo da novela das oito.
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Havia um comando secreto:
COLOR ,,,que alterava a paleta da tela — recurso avançadíssimo pra quem vinha do mundo monocromático dos TKs. -
A Milmar fabricava o Hotbit com componentes nacionais, graças à reserva de mercado, o que deu ao computador um charme “brasileiro” no hardware.
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Alguns usuários ousados ligavam dois Hotbits via porta de joystick para trocar dados — o sneakernet raiz.
🖥️ Da tela azul à tela preta
A vida me levou do Hotbit doméstico ao MVS corporativo — do “OK” piscando na TV de 14 polegadas à tela preta do TSO.
Mas a sensação, curiosamente, é a mesma:
olhar o cursor piscando, digitar uma linha, e saber que algo vai acontecer.
O Hotbit me ensinou a imaginar.
O TK-85 me ensinou a persistir.
O Mainframe me ensinou a respeitar a grandeza das máquinas e a precisão das ideias.
E hoje, entre mainframes que processam bilhões e inteligências artificiais que escrevem poesia, eu ainda lembro daquele quarto em Quiririm.
De um garoto curioso, hipnotizado pela tela azul, sem saber que estava assistindo à primeira linha de código do próprio destino.
☕ Epílogo
A televisão daquela casa não era só uma tela — era uma janela para o futuro.
O Hotbit, o TK-85 e o MVS eram capítulos de uma mesma história: a da curiosidade humana e da vontade de dominar o invisível.
E talvez seja isso o que une o garoto do BASIC ao analista do mainframe:
a certeza de que toda máquina, por mais fria que pareça, guarda um eco do nosso espanto — aquele mesmo que começou, um dia, diante de uma pequena TV de 14 polegadas em Quiririm.
Bellacosa Mainframe
☕ Porque toda máquina tem alma — e todo código começa com um olhar curioso diante de uma tela azul.
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