quarta-feira, 12 de setembro de 2018

🜂 Miyamoto Musashi — O Espadachim que Pintou o Vazio

 

🜂 Miyamoto Musashi — O Espadachim que Pintou o Vazio

“A vitória é conquistada antes que a espada seja desembainhada.”
Miyamoto Musashi, Gorin no Sho (“O Livro dos Cinco Anéis”)

Ⅰ. O Homem Que Caminhava Sem Sombra

No amanhecer enevoado de 1584, em Harima, nasce Shinmen Takezō, aquele que o tempo renomearia como Miyamoto Musashi — o andarilho do aço e da tinta.
Aos treze anos, mata seu primeiro oponente num duelo.
Aos trinta, já havia vencido mais de sessenta duelos, sem jamais ser derrotado.
Mas a verdadeira história não é a contagem das vitórias, e sim o que elas esculpiram dentro dele: um homem que via na luta não a glória, mas a revelação.

Musashi vagava sem mestre, sem clã, sem casa.
Recusava o conforto dos samurais contratados e os juramentos ao shogun.
Carregava duas espadas — uma longa e uma curta — não apenas como armas, mas como símbolos da dualidade: matéria e espírito, técnica e intuição, o visível e o invisível.

Era o guerreiro que compreendeu que, em certos caminhos, a solidão é o único sensei.


Ⅱ. O Caminho das Duas Espadas

A lenda conta que Musashi criou o Niten Ichi-ryū, “o estilo de dois céus como um só”, uma escola de combate com duas espadas simultâneas — símbolo de um espírito que unificou contrários.
Mas no âmago, essa técnica era uma metáfora:
a mão esquerda e a direita em harmonia, o pensamento e o instinto fluindo sem ruptura.
O inimigo verdadeiro não era o outro — era o desequilíbrio.

Musashi compreendia o combate como arte total: o som do vento, o brilho do ferro, a respiração do oponente, tudo fazia parte da mesma pintura.
Cada golpe, uma pincelada no quadro do instante.


Ⅲ. O Artista do Vazio

Após abandonar os duelos, Musashi tornou-se pintor, calígrafo, escultor e escritor.
Retirou-se para uma caverna — Reigandō, o “Salão do Espírito do Rochedo” — onde escreveu seu testamento espiritual:
📜 O Livro dos Cinco Anéis (Gorin no Sho).

Cinco elementos estruturam o tratado — Terra, Água, Fogo, Vento e Vazio —, que juntos formam uma filosofia além da espada.
Ele dizia:

“No Vazio, há apenas clareza e verdade.”

O Vazio de Musashi não é o nada, mas o tudo que não é forma:
o ponto antes da ação, o instante em que o guerreiro e o mundo respiram juntos.
É o mesmo Vazio que o zen-budismo chama de mushin — a mente sem ego.


Ⅳ. Curiosidades e Ecos

  • 🗡️ Duelos notórios: O mais famoso foi contra Sasaki Kojirō, lutado numa praia ao entardecer. Musashi chegou atrasado de propósito, irritando o rival — e venceu com uma espada de madeira esculpida de um remo.

  • 🎨 Artista refinado: Suas pinturas em tinta sumi-e são simples e espirituais, com traços de um zen profundo — o mesmo gesto que guiava sua espada guiava seu pincel.

  • 📖 Influência moderna: Sua filosofia inspirou mestres de artes marciais, estrategistas militares e até executivos japoneses.

  • 🕯️ Lenda solitária: Morreu sentado, de armadura, como se ainda estivesse esperando um último duelo — contra o tempo.


Ⅴ. O Espírito Bellacosa do Guerreiro

Musashi é o espelho de um tempo em que a arte e a guerra ainda se olhavam nos olhos.
Em sua vida há o drama universal do criador: o homem que busca a forma perfeita até dissolver-se nela.
Ele lutou contra guerreiros, contra o mundo — e finalmente, contra si mesmo.
E ao perder o “eu”, venceu o medo.

Há em Musashi uma verdade que ecoa para quem cria, atua, escreve ou vive em cena:
a de que a disciplina e o delírio são irmãs,
e que a técnica é apenas o corpo do espírito.


🌸 “Percebe o ritmo das coisas — e tornar-te-ás invisível.”
Musashi no Gorin no Sho