quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

A internet ficou mais chata?

 


A internet ficou mais chata?

Censura, vigilância moral e o fim da autonomia digital**

Por muito tempo a internet representou o território da liberdade. Espaço onde se tropeçava no bizarro, no proibido, no criativo e no nonsense sem filtro. Nos últimos anos, entretanto, a sensação dominante entre muitos usuários é clara: algo mudou. Tudo parece altamente policiado. Há sempre alguém julgando, denunciando ou “ensinando o que é o certo”.

A pergunta surge com força:
por que a internet está mais chata e moralista?

Este post não busca respostas absolutas. O objetivo é mapear os elementos que explicam essa “nova ordem digital”.


1. Plataformas centralizaram o poder

A internet antes era fragmentada. Hoje, concentra-se em meia dúzia de aplicativos. Quem controla essas plataformas controla:

• o que pode ser dito
• o que pode ser visto
• o que pode ser monetizado

O algoritmo virou o verdadeiro editor-chefe do mundo. Ele decide o que ganha espaço e o que é enterrado no limbo do irrelevante. Isso gera a sensação de que há um “curador invisível” guiando nossas escolhas.


2. A monetização exige ambiente “seguro”

Publicidade teme polêmicas. Para proteger anunciantes, as plataformas implementam filtros mais rígidos. Conteúdos eróticos, violentos, politizados ou “tabu” sofrem desvalorização automática.

Resultado:
o conteúdo neutro e insosso é mais recompensado do que o autêntico e arriscado.

A criatividade perde para o medo de ser desmonetizado ou banido.


3. Novo puritanismo social

Mesmo sem leis diretas, a vigilância moral aumentou. Grupos organizados promovem cancelamentos e campanhas de linchamento simbólico. Certas opiniões deixam de ser “controversas” para se tornarem proibitivas.

Isso gera autocensura. O usuário passa a se policiar para evitar punição social.


4. Regulamentações estatais em expansão

Governos adotam legislações para combate a:

• desinformação
• ódio
• exploração
• crimes virtuais

Essa normatização surge de preocupações legítimas, porém cria efeitos colaterais. Para evitar problemas legais, empresas aumentam o bloqueio automático de temas sensíveis.

O risco é simples: no esforço para proteger, pode-se começar a tolher demais.


5. O algoritmo quer perfeição emocional

Plataformas associam “bem-estar” a ausência de desconforto. Qualquer conteúdo complexo, provocativo ou que exija reflexão pode ser interpretado como “negativo”.

Assim, a cultura da internet se infantiliza. O contraditório vira inimigo.

A máquina protege o usuário do mundo, mas também o protege de pensar.


O que realmente mudou

A internet não é mais o espelho da humanidade.
Ela se tornou o produto daquilo que empresas e comunidades acreditam que deve ser aceito.

Antigamente:
→ o usuário moldava a rede
Hoje:
→ a rede molda o usuário

Cada clique é avaliado.
Cada palavra é rastreada.
Cada desejo é classificado.

A autonomia dá lugar à curadoria forçada.


Conclusão

A pergunta do título talvez esteja mal formulada.
A internet não ficou necessariamente mais “chata”.
Ela ficou governada.

O espaço que antes era caos criativo agora opera sob:

• algoritmos que selecionam o que “pode”
• moralistas que policiam o que “deve”
• anunciantes que decidem o que “vende”

A liberdade existe… desde que dentro das regras do feed.

A era da internet anárquica terminou.
Vivemos agora na internet domesticada.

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