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sábado, 24 de dezembro de 2005

FORTE APACHE GULLIVER — O SISTEMA OPERACIONAL DA INFÂNCIA

 


FORTE APACHE GULLIVER — O SISTEMA OPERACIONAL DA INFÂNCIA

Existem brinquedos.

Existem brinquedinhos.
E existe o Forte Apache da Gulliver — uma entidade que transcende plástico, tinta, escala 1:35 e infância.

Para muitos foi só um brinquedo.
Para mim foi companheiro, cenário, portal, quase uma LPAR emocional em que eu podia subir quantas instâncias de imaginação quisesse.

Não lembro a idade exata.
Só lembro que era pequeno — daqueles pequenos que ainda caem de bunda no chão — quando ganhei meu primeiro Forte Apache.



E, meus amigos… aquele era O Forte Apache.
De madeira.
Com o cheiro doce de tinta artesanal.
Tinha casa-sede, as quatro torres, soldados a pé, a cavalo, um menino e um cão pastor preto que parecia sempre pronto para salvar o dia.
Tudo pintado à mão.
Não era um conjunto de brinquedo.
Era uma obra de arte do artesanato brasileiro dos anos 70.



Aquela fortaleza era meu microcosmo de batalhas épicas:
Cowboys bravos, Sétima Cavalaria, guerreiros apaches, dramatizações infantis de uma América inventada entre a TV Record, a TV Tupi e os western spaghetti de Giuliano Gemma que eu assistia em preto e branco.

E ali, sem manual, sem supervisão, sem “adoçantes didáticos”, meu imaginário treinava estratégias, narrativas, táticas, diplomacias e… guerras.
Sim, era outra época.
Sem a patrulha do politicamente correto.
Sem filtro.
Sem revisões históricas.
Apenas a imaginação crua, selvagem, viva — como devia ser.


1982 — O SEGUNDO FORTE

O tempo passa, os anos mudam, a Gulliver simplifica materiais, abandona tintas caras…
Mas em 1982, quando ganhei o segundo Forte Apache, a magia estava lá.
Menos pintura à mão, mais padronização.
Mas ainda com alma.

O realismo permanecia.
O espírito também.
E as histórias ganhavam novas luzes, novos personagens, novos “episódios”.




1984 — O TERCEIRO, A EXPANSÃO DO UNIVERSO APACHECINEMÁTICO™

Em 1984, veio o terceiro.
O que já era saga virou trilogia.
E trilogias, como todo nerd sabe, são portais de poder.

Eu construí cidades, inventei batalhas, narrei vitórias e derrotas.
Ali aprendi — sem querer — storytelling, estratégia e até logística de guerra.

A infância é sábia: ensina brincando, sem avisar.




ANOS 1990–2000 — O COLECIONADOR DESPERTA

O tempo seguiu.
O menino cresceu.
Mas o Forte Apache nunca foi embora.

Com dinheiro próprio, comprei mais três.
Era um reencontro com o passado, um handshake entre versões do mesmo “eu”.

E um dia, já adulto, comprei um especialmente para o meu filho.

Porque algumas heranças não podem ser guardadas no banco.
Elas devem ser transmitidas como chama, não como cinza.




POR QUE IMPORTA TANTO?

Porque o Forte Apache não era plástico.
Era território.
Era portal.
Era código-fonte da imaginação.

Foi ali que aprendi a criar universos.
Foi ali que o mundo começou a expandir.
Foi ali que comecei a me tornar quem sou.

Quando adulto, a gente olha para trás e descobre que certos objetos não eram objetos: eram arquiteturas emocionais.

E na minha, no meu “mainframe da memória”, há um dataset inteiro, catalogado, indexado e replicado nos backups afetivos, chamado:

FORTAP.APACHE.GULLIVER.LOVE(197X–HOJE)





sexta-feira, 24 de dezembro de 2004

GULLIVER — O REINO BRASILEIRO ONDE A IMAGINAÇÃO SEMPRE CABE NUMA MÃO

 


GULLIVER — O REINO BRASILEIRO ONDE A IMAGINAÇÃO SEMPRE CABE NUMA MÃO
Um post ao estilo Bellacosa Mainframe para o blog El Jefe Midnight Lunch





Quando pensamos em Brasil das décadas de 60, 70, 80 e 90, muita gente lembra primeiro de TV preto-e-branco, carro com carburador, feira na calçada, mercearia da esquina… Mas há um fio invisível que costura a infância de milhões de brasileiros: uma pequena legião de soldados de plástico, índios bravos, cowboys destemidos, super-heróis troncudos e monstros improváveis.
Esse fio tem nome: Gulliver.

E como todo bom mito pop, a história da Gulliver mistura engenho brasileiro, ousadia industrial, guerra cultural, brinquedos que viraram patrimônio afetivo — e muitos easter-eggs que ninguém imagina. Prepare seu cavalo, pegue sua Winchester de plástico e siga comigo.


🌄 A ORIGEM — O DESERTO, O SONHO E O PLÁSTICO

A Gulliver nasce em 1956, em São Caetano do Sul (SP), fundada por José “Zeca” Matarazzo Filho — não o conde, mas um industrial com faro para um mercado que estava nascendo: o de brinquedos de plástico injetado.

Enquanto os brinquedos do Brasil ainda eram majoritariamente de lata, madeira ou pano, a Gulliver apostou forte na nova técnica. E acertou: o plástico permitia detalhes finíssimos, moldes ousados, variedade absurda e — principalmente — preço acessível.

E assim, num barracão no ABC paulista, começa o reinado que duraria gerações.




🏹 O FORTE APACHE — O PRIMEIRO UNIVERSO CINEMATOGRÁFICO BRASILEIRO

O carro-chefe absoluto?
O Forte Apache.

Originalmente licenciado da empresa norte-americana Louis Marx & Co., a Gulliver tropicalizou, expandiu, redesenhou e reinventou o playset até transformá-lo em algo 100% culturalmente brasileiro.

Versões em madeira, versões em plástico, versões pintadas à mão…
Sede, quartéis, torres, cavalaria, índios apaches, cowboys, meninos sorridentes, cachorros pastores, carroções, canhões — um universo inteiro numa mesa de poucas polegadas.

O Forte Apache da Gulliver foi, para uma geração, o primeiro “metaverso” de verdade:

  • sem login,

  • sem Wi-Fi,

  • sem NFT,

  • mas com imaginação ilimitada.



👊 A ERA DE OURO — SUPER-HERÓIS, MONSTROS E UM BRASIL POP

Dos anos 60 aos 90, a Gulliver reinou absoluta.

🦸 Super-Heróis

Licenciou Marvel e DC quando isso ainda não era cool.
Se você lembra de um Hulk verde berrante, um Thor cabeçudo, um Superman com peito em formato de barril, você sabe do que estou falando.

👽 Monstros

Godzilla, King Kong, criaturas do espaço — tudo ganhava forma em PVC duro e eternizava tardes inteiras de batalha no chão da sala.

⚔️ Playsets temáticos

Forte Apache, Castelo Medieval, Vila do Zorro, Piratas, Cavaleiros, Romanos…
Cada kit era um portal instantâneo para outra época.

🚀 Ficção Científica & Robôs

Robôs de fricção, astronautas, monstros radioativos — um eco direto da paranoia nuclear e dos seriados japoneses que chegavam ao Brasil.

🗡️ Os eternos gladiadores Gulliver

Pequenos, coloridos, com poses icônicas — presentes em cada mercearia, banca de jornal e lojinha da 25 de Março.



🧩 CURIOSIDADES E EASTER-EGGS PARA COLECIONADORES

A Gulliver produziu peças para outras empresas — incluindo lotes secretos exportados sem marca.
Muita coisa hoje é “Gulliver sem saber”.

Existem moldes perdidos — literalmente extraviados nos anos 80 e 90. Alguns foram recuperados décadas depois em galpões abandonados.

A pintura a mão do Forte Apache original foi feita majoritariamente por equipes femininas do ABC Paulista, artesãs com precisão impressionante.

O cachorro pastor preto que acompanhava o menino no playset original foi inspirado no cão real de um funcionário da empresa.

✔ Nos anos 70 e 80, a Gulliver teve licenças do Ultraman, Jaspion e outros tokusatsu, mas muitos produtos nunca chegaram às lojas.

✔ A empresa criou a primeira linha nacional de minimodelos históricos, usada até em escolas durante anos.


📉 O DECLÍNIO — A INVASÃO DOS IMPORTADOS

A partir dos anos 90, com a abertura econômica e a entrada massiva de brinquedos chineses, o cenário mudou:

  • O custo de moldes metálicos era altíssimo.

  • As linhas clássicas vendiam menos.

  • O varejo migrou para produtos mais baratos e descartáveis.

  • Empresas nacionais sofreram — a Gulliver, inclusive.

A produção foi reduzida, algumas linhas desapareceram, outras tiveram tiragens curtas. Mas a marca nunca morreu.


🔥 O ESTADO ATUAL — GULLIVER, A FÊNIX DO PLÁSTICO

Hoje, a Gulliver existe — viva, reinventada e nostálgica.

A empresa se reposicionou como marca clássica, apostando em:

  • relançamentos de linhas vintage,

  • séries de edição limitada,

  • produtos colecionáveis,

  • parcerias com grupos de fãs e historiadores do brinquedo brasileiro.

O público?
Adultos entre 35 e 60 anos que carregam na alma o chão da sala onde guerrearam com cavaleiros e apaches.


🌵 DICAS PARA COLECIONADORES (AO ESTILO BELLOSA MAINFRAME)

  1. Prefira moldes antigos — geralmente mais pesados, com PVC mais duro e detalhes mais finos.

  2. Evite restaurações mal feitas — tinta errada destrói valor.

  3. Guarde em estojos fechados — o PVC é sensível à luz e pode ficar quebradiço.

  4. Fique de olho em relançamentos oficiais — alguns são raros já ao nascer.

  5. A comunidade “Gullivermaníacos” no Brasil é riquíssima — grupos no Facebook, Orkut ressuscitado, fóruns especializados.

  6. Cuidado com falsificações chinesas — sim, existem.

  7. O Forte Apache completo com pintura à mão é um Graal — conserve como um DB2 catalog root page.


🌙 CONCLUSÃO — GULLIVER, O MAINFRAME DA NOSSA INFÂNCIA

O que o mainframe tem em comum com a Gulliver?
Longevidade, confiabilidade, legado e presença silenciosa na vida de milhões.

A Gulliver é o nosso “CICS da imaginação”:

  • sempre em produção,

  • sempre entregando,

  • sempre suportando volume,

  • sempre pronta para rodar mais uma aventura.

E assim como o mainframe, ela atravessou gerações — sólida, nostálgica, parte da história nacional.

Se você teve um Forte Apache, um cowboy, um índio, um Hulk esquisitão, um gladiador colorido…
Você carrega Gulliver no coração.

E como sempre digo: nostalgia também é arquitetura — arquitetura da alma.