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sexta-feira, 3 de outubro de 2014

📼 Episódio Especial: “Os Caçadores de Içá — Parte 2: A Primavera dos Onis”

 


🌙🍱 El Jefe Midnight Lunch — Crônicas de um Bellacosa Mainframe 🍱🌙
📼 Episódio Especial: “Os Caçadores de Içá — Parte 2: A Primavera dos Onis”
por Vagner Bellacosa – direto do dataset das memórias de 1983


Se você leu a Parte 1, já sabe que minha introdução ao universo gastronômico do interior — as lendárias tanajuras — aconteceu em Novo Horizonte. Mas, quando nos mudamos pro CECAP de Taubaté, descobri que a cultura formigueira não tinha CEP. Ali também apreciavam a famosa içá, a tal formiga bunduda que deixava qualquer oni de olho brilhando e barriga roncando.

Estamos em outubro de 1983.
Passado o tempo de Cosme e Damião, comemorado em 27 de Setembro, quando a garotada fazia o looping completo pelas quadras do CECAP atrás de doces, muito antes da moda do Halloween chegar ao Brasil. Mas outubro tinha outro evento ainda mais aguardado — e este, sim, fazia o coração dos pequenos caçadores acelerar como CICS em pico de transação:

🌧️ A Primeira Grande Chuva da Primavera

Quando a chuva caía forte pela primeira vez, não era só sinal de estação nova.
Era o trigger oficial, o SVC 13, o chamado ancestral.

Era o início da Revoada das Rainhas, quando as içás aladas deixavam os ninhos para criar novas colônias. E, meu amigo… quando isso acontecia… era festa pura... momentos emocionantes, ferroadas e cicatrizes para contar historia.



Dezenas de pequenos onis se espalhavam pelo CECAP numa verdadeira operação de guerra, em busca dos enormes formigueiros de salvas.

Era Black Friday do mato.



Acreditem em mim, esses formigueiros eram enormes com dezenas de câmaras, atingindo uns 5 metros de profundidade e um raio de 10 metros de circunferência com inúmeros tuneis de saída, por onde voavam as saúvas, os sabitus e saiam enormes guerreiros com ferrões monstruosos.





🪖 A Batalha dos Formigueiros

Não pense que era fácil, não.
Os formigueiros tinham defesa anti-invasão digna de mainframe militar.

De dentro dos buracos saíam centenas de milhares de soldados, mordendo tudo o que se movia — inclusive nós. E olha, vou te dizer…

A mordida daquelas formigas era um corte profundo, ardido, que fazia qualquer criança repensar suas escolhas. Mas os onis eram resilientes, adaptáveis, como programadores de JCL lidando com abends misteriosos.



🔧 As Técnicas dos Caçadores

Cada oni tinha seu framework pessoal:



  • Bacias de água para coletar as içás boiando;

  • Dois baldes — um para as aladas, outro para as que perdiam as asas, brincadeira alguns artista ficavam com um pé em cada balde;

  • Botas de borracha (só os ricos do CECAP tinham);

  • E eu?

Eu era mais criativo.



Eu reciclava e vestia sacos plásticos de 5 kg de arroz nos pés.
Aqueles sacos eram grossos, fortes e anti-formiga, quase um RACF PERMIT CLASS(FORMIGA) ACCESS(NONE) para proteger meus tornozelos.

Com os pés devidamente blindados, eu me sentia um cavaleiro medieval enfrentando um exército inimigo — só que o prêmio, eram formigas, não castelos.



Quando as formigas venciam, levávamos mordidas extramente dolorosas, pois fechavam a pinça na carne, profundamente e rápido. A única maneira de parar era arrancando a cabeça e pedacinhos de carne junto, saindo bastante sangue, que deixava as formigas mais loucas ainda.




🏆 A Colheita

Depois de horas de caça, mordidas, correria e gritos, vinha a recompensa.

Às vezes 500g.
Com sorte, 1 kg de tanajura.



Era ouro entomológico.

Mas aí vinha a parte realmente difícil: nenhuma mãe no CECAP — e eu repito, NENHUMA — queria a casa cheirando a formiga frita.

Não dava pra usar o fogão.
Era proibido.
Era ABEND S0C7 na hora.



🔥 A Gambi-Tecnologia do Oni

Eu, como bom engenheiro de soluções improvisadas (treino que mais tarde me levaria ao mundo do mainframe), resolvia assim:

  1. Pegava uma lata de leite grande (Ninho, claro — sempre ele).

  2. Montava uma fogueira no campinho atrás dos prédios.

  3. Fazia ali mesmo a fritura ritualística.

Problema resolvido.
Casa sem cheiro.
Barriga feliz.
Oni orgulhoso.




🍛 O Caviar Tupiniquim

Um professor de ciências dizia:

“A tanajura é o caviar brasileiro.”

E não é que era mesmo?

Crocante, gordurosa na medida, um sabor que até hoje volta na memória com aquele cheiro de terra molhada da primavera de 83.

A infância salgada, doce e crocante, tudo ao mesmo tempo.

PS: Curioso hoje ver a polémica gerada por alguns grupos do consumo de proteína oriunda de insetos, realmente esses meninos e meninas, que nasceram em apartamento sabem pouco sobre as aventuras do interior de antigamente.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

📜 Memórias Sem Índice, Sem Catálogo, Sem Timeline — Volume “O Limbo 70–80”

 

📜 Memórias Sem Índice, Sem Catálogo, Sem Timeline — Volume “O Limbo 70–80”
Ao estilo Bellacosa Mainframe, com fragmentos soltos como cartões perfurados lançados ao vento.


Há um período nas minhas memórias que não respeita calendário, lógica, cronologia ou bom senso.
É o limbo 1970–1980 — um buffer de lembranças onde tudo se mistura:

  • São Paulo,

  • interior,

  • avós,

  • primos,

  • mudanças,

  • calor,

  • poeira,

  • brincadeiras,

  • e o eterno improviso da família Bellacosa.

Esse capítulo é sobre Ibitinga — a terra dos bordados, da brasilite fervendo e das tanajuras crocantes.



🌞 Ibitinga — O Caldeirão de Asfalto e Telha Brasilit

Meu pai, na eterna missão de “agora vai”, resolveu negociar os famosos bordados de Ibitinga.
E isso, claro, gerou mais uma migração.

Da casa lembro de três coisas:

  • um calor monstruoso, daqueles que fazem miragem na sala;

  • o barulho metálico da telha brasilite dilatando no sol;

  • e a liberdade absoluta: brincar na rua até tarde, correr, subir em coisas, cair de outras.

Foi lá também que provei um prato típico, obra da fauna local e da curiosidade infantil:
tanajuras assadas.

Crocantes. Amanteigadas.
Uma explosão de proteínas.
O primeiro snack gourmet de sobrevivência.


🪔 A Noite do Lampião e o Fusca de Farol Aceso

Mas a grande lembrança, a história digna de um Bellacosa Midnight Files, foi a visita a um sítio nos confins do município.

Sem energia elétrica.
Lampião de querosene.
Galinheiros.
Cavalo arisco.
E o som eterno do mato — cri cri cri.

Meu pai fez amizade com os sitiantes, e fomos passar o dia lá.
À noite, moeram cana para fazer guarapa: o caldo de cana raiz, aquele que pinga direto do engenhoca de madeira.

Tudo ia bem… até meu pai cometer um clássico:

deixar o farol do Fusca aceso.

Sim.

Fusca 1960 e alguma coisa, bravíssimo, mas com uma bateria do tempo de D. Pedro I.
Depois de horas iluminando o nada do mato:

puff — bateria morta.
Carro não pega.
Nem com reza forte.



🐎 A Jornada Noturna de Charrete

E aí começou o episódio épico.

— “Vamos pegar uma bateria emprestada no outro sítio.”

Montaram a charrete.
Lá fomos nós, com um cavalo que claramente não assinou contrato para aquele turno extra.

No caminho, tudo escuro.
Mato fechando.
Cheiro de bicho.
E nós, balançando na charrete como se fôssemos figurantes de filme de cangaço.

Resultado?

Ninguém tinha bateria.
Voltamos frustrados.
Dormimos no sítio.

Dormir improvisado no interior é assim:
um colchão antigo, cheiro de madeira, barulho de grilos e a lanterna tremulando no lampião.


🍊 O Exterminador do Pomar

No dia seguinte, eu perambulava pelo sítio quando o amigo do meu pai fez um gesto de silêncio:

— “Vem cá… sem barulho…”

Ele aponta para um pé de laranja.
Vai chegando devagar, devagarinho…

De repente, num movimento digno do Circo Garcia:

Pega uma cobra pelo rabo.
Rodopia.
PA-BUM!

O reptil não teve chance alguma.
Foi o shutdown definitivo.

Eu, criança, assisti tudo com:

  • 40% choque

  • 30% fascínio

  • 20% medo

  • 10% pensando: “ainda vou escrever isso no futuro.”


🍆 As Berinjelas…

Mas essas ficam para o próximo bloco de memória, porque história boa tem que vir em clusters, não em full load.