🍰 O Bolo de Fubá, os Peixinhos e o Amor de Terceira Série
(por Bellacosa Mainframe — SĂ©rie “Sempre um Isekai” CapĂtulo III)
Lembranças de Pirassununga.
Um bairro no fim da cidade, onde o asfalto se rendia ao barro e os dias eram longos como verões eternos.
Os cĂłrregos serpenteavam preguiçosos entre as pedras, e neles nadavam bagres, lebistes e outros pequenos tesouros lĂquidos.
Foi ali, num pedaço esquecido do mapa, que vivi um dos capĂtulos mais doces da minha infância.
Vindo de SĂŁo Paulo, descobri um mundo novo — sem muros, sem medo, sem pressa.
A liberdade tinha cheiro de mato e som de cigarra.
O pequeno bosque atrás das casas era, aos olhos de um menino de nove anos, uma floresta inteira — densa, misteriosa e cheia de promessas.
Com peneiras, calotas de Fusca e as bacias de revelação fotográfica do meu pai, eu me tornava um caçador de peixinhos.
Levava-os para casa, criava aquários improvisados, nomeava cada um e via neles a mesma curiosidade que eu sentia pelo mundo.
🏫 A sala mágica da professora Maria
Na escola, a professora Maria do 3º ano era uma espécie de arquiteta de sonhos.
Tinha conquistado o privilĂ©gio de ter uma sala sĂł sua — uma raridade naquela Ă©poca.
Transformou o espaço num jardim de ideias: flores, cartazes, livros, desenhos, e um aquário que se tornou o coração pulsante da turma.
Eu trouxe os primeiros peixinhos.
Alimentávamos juntos, trocávamos a água, observávamos suas danças silenciosas.
Entre risadas, descobri algo novo: a amizade, o encanto e aquela leve confusĂŁo no peito que, mais tarde, aprenderia a chamar de amor.
💕 Luciana e o bolo de fubá
Havia a MĂ©rcia, pela qual eu tinha uma quedinha discreta… mas quem roubou de vez minha atenção foi Luciana, uma menina loirinha, simpática, com olhos curiosos e um sorriso que parecia entender todos os meus segredos.
Um dia, ela me pediu peixinhos — e eu, cavaleiro de nove anos e alma de explorador, prometi levar.
“Mas leva na minha casa, tá?”, disse ela, com medo de derrubar os bichinhos no caminho.
Cheguei com o coração acelerado, segurando o pote com cuidado.
A mĂŁe dela me recebeu com um sorriso que parecia o prĂłprio sol.
Nos deixou brincando no quintal.
E entĂŁo o ar se encheu de um cheiro inconfundĂvel — bolo de fubá assando no forno.
Foi ali, entre risadas, peixinhos e farelo doce, que ganhei minha primeira namoradinha escolar.
Cada visita era um ritual: ela me esperava, a mĂŁe servia o bolo, e o mundo parecia simples e perfeito.
🌧️ O vento muda
Foram meses felizes, cheios de risadas, sol e inocĂŞncia.
Mas o destino, caprichoso como sempre, preparava a tempestade de 1983 — mudanças, despedidas e o inĂcio de outra jornada.
Antes que tudo mudasse, vivi intensamente cada dia em Pirassununga.
E hoje, décadas depois, basta sentir o cheiro de bolo de fubá para que o tempo se dobre, e eu volte a ser o menino de calças curtas, segurando um vidro com peixinhos e o coração batendo rápido.
☕ EpĂlogo Bellacosa
Nem todo cĂłdigo Ă© feito de bits.
Alguns sĂŁo feitos de memĂłrias, sabores e afetos.
Pirassununga foi meu primeiro “sistema” fora do grande centro — um ambiente simples, mas com dados preciosos gravados na alma.
E o bolo de fubá é meu checkpoint de ternura, meu restore point para quando a vida fica pesada.
Porque, no fim, cada lembrança Ă© um backup daquilo que fomos…
E toda infância bem vivida Ă© um programa que ainda roda — mesmo depois de tantos reboots.
#bolofuba #pirassununga #peixinhos
Ps: Qual caminho a vida da jovem Luciana tomou? O que será dela no século XXI?
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