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domingo, 15 de junho de 2014

🎮 Insert Coin — O Isekai Brasileiro dos 8 Bits

 


🎮 Insert Coin — O Isekai Brasileiro dos 8 Bits

por Vagner Bellacosa – Blog El Jefe / Bellacosa Mainframe

O mundo dos jogos eletrônicos teve, para mim, dois momentos de virada — dois portais mágicos que abriram as portas do infinito.
O primeiro foi ainda no final da década de 1970, quando meu pai nos levou à casa de conhecidos que haviam adquirido um Telejogo. Sim, o primeiro console brasileiro, fabricado pela Philco-Ford. Aquela caixa preta com dois controles fixos e uma chave seletora no painel parecia coisa de ficção científica. Mas deixemos o Telejogo para outro capítulo — porque o verdadeiro choque de luz e som veio logo depois, com o pinball.

Meu pai adorava fliperama, e eu, ainda pequeno, o acompanhava nos salões de jogos e nos botecos do bairro.
As máquinas piscavam como árvores de Natal psicodélicas, cheias de luzes, ruídos metálicos e sons estridentes. A bolinha de aço saltando, as palhetas vibrando, o contador analógico estalando a cada ponto conquistado.
Era o coração mecânico da diversão.

Mas eu, pequenino e já curioso, me fascinava mesmo eram pelos jogos Arcade, aquelas adoráveis maquinas de jogos eletrônicos operadas por fichas — os primeiros games com somente dois botões e um joystick que projetavam um universo inteiro em uma tela. Eu era pequenino e nem alcançava a consola, eles colocavam uma banqueta para poder ter imersão completa.



Aquilo era pura magia.
Como era possível que algo tão pequeno gerasse tanta emoção?
Como se criava algo assim?
Ali nasceram as primeiras sementes do programador que eu viria a ser.



Vieram então os ícones da era dourada dos 8 bits:
Pac-Man, River Raid, Enduro, Space Invaders, e tantos outros que cabiam em cartuchos ou fitas cassete. Cada jogo era uma jornada — uma microaventura onde a imaginação completava o que os pixels não podiam mostrar.




Com o início da década de 1980, as máquinas ganharam mais poder, mais cores e mais botões.
As fichas metálicas tilintando nas bancadas dos bares se tornaram meu passaporte para outro mundo.
A cada insert coin, um novo universo se abria — e, sem perceber, eu estava aprendendo lógica, padrões, reações. Estava decifrando sistemas.
Cada game over era uma lição de persistência; cada continue era um código de vida.

E lá estava eu, no meio da revolução eletrônica, sem saber que aquele fascínio pelos circuitos e sprites me levaria, anos depois, ao encontro de outro gigante de ferro e silício — o IBM Mainframe.
Do fliperama ao MVS/360, dos 8 bits aos 32 bits, das fichas metálicas ao cartão perfurado, o salto foi enorme — mas o espírito era o mesmo: entender o que havia por trás da tela.
Da bolinha prateada aos datasets, o menino curioso continuava apertando Start.




🕹️ Easter Eggs e Curiosidades

  • O Telejogo brasileiro foi lançado em 1977 e tinha apenas três modos de jogo — tênis, futebol e paredão — todos variantes do Pong da Atari.

  • Os fliperamas eletromecânicos antecederam os pinballs eletrônicos e funcionavam à base de relés, motores e contatos metálicos.

  • O termo insert coin (insira a moeda) virou símbolo cultural dos anos 80 e 90, e até hoje aparece como easter egg em diversos sistemas e programas criados por desenvolvedores nostálgicos.

  • Curiosamente, alguns mainframes IBM antigos usavam sons e luzes em painéis que lembravam muito um pinball — uma ironia tecnológica que unia o sagrado e o profano da computação.


No fim das contas, toda a nossa geração foi um pouco assim:
aprendeu lógica no fliperama, digitação no BASIC, e disciplina na escola da vida.
O fliper era o debug da infância, e o Telejogo, o BIOS do imaginário.
Entre fichas e cartões perfurados, nascia o programador que ainda hoje, diante da tela, continua ouvindo a mesma voz de sempre:
“Insert Coin.”

quarta-feira, 26 de março de 2014

💾 TK-85 — O 8 bits que roubava a televisão da novela

 



💾 TK-85 — O 8 bits que roubava a televisão da novela

Por Bellacosa Mainframe

Antes da IA, antes do chat, antes do Wi-Fi, existia um tempo em que o computador ligava na televisão da sala.
E essa televisão era a única da casa.
Era um Brasil analógico, dividido entre o chiado da fita cassete e o som do tema de abertura da novela das oito.
E foi nesse cenário que chegou o TK-85 — meu primeiro microcomputador pessoal, e talvez o primeiro portal que me levou ao universo digital.



🧩 O nascimento de um herói de 8 bits

O TK-85 foi lançado em 1983 pela Microdigital Eletrônica, em São Paulo.
Era o sucessor direto do TK-82C, e um clone brasileiro do ZX Spectrum, da inglesa Sinclair Research.
Mas, como tudo no Brasil, o TK-85 tinha sotaque próprio: tropicalizado, adaptado, cheio de improviso e paixão.

Ele vinha com um processador Zilog Z80A rodando a 3,25 MHz, entre 16K e 48K de RAM, e um interpretador BASIC gravado na ROM.
O armazenamento? Fita cassete comum — o mesmo gravador usado pra ouvir Roberto Carlos no domingo.
Era o computador de mesa… sem mesa. O monitor era a TV da família, e o “boot” acontecia quando ninguém estava assistindo novela.



📺 Drama doméstico: a TV ou o futuro?

Ligar o TK-85 era um ritual doméstico e diplomático.
Eu esperava pacientemente a hora certa — quando o jornal acabava e a novela ainda não tinha começado.
Conectava o cabo de RF na traseira da televisão, girava o seletor até aparecer aquela imagem mística:

MICRODIGITAL TK-85 OK

Era um milagre tecnológico piscando na tela da Philco.
Mas bastava minha mãe gritar da cozinha — “Menino, desliga isso que vai começar Roque Santeiro!” — e o futuro precisava esperar mais um capítulo.
Hoje penso que, de alguma forma, era poético: enquanto o Brasil inteiro sonhava com a ficção das novelas, eu sonhava com as ficções da lógica, com universos feitos de números e comandos.

🧠 Um professor silencioso

O TK-85 foi meu primeiro professor digital.
Com ele aprendi o poder da lógica, a paciência da depuração, a beleza de ver uma linha de código funcionar.
Era simples, direto — e absolutamente mágico:

10 PRINT "HELLO, WORLD" 20 GOTO 10

A tela da TV se enchia de palavras infinitas, e eu sentia que tinha descoberto uma nova linguagem — uma conversa secreta com a máquina.
Enquanto o mundo via apenas letras piscando, eu via mundos inteiros surgindo de um “OK”.

🕹️ Cultura, curiosidades e nostalgia

  • O nome “TK” vinha de Tadao Kogyo, fundador da Microdigital.

  • Jogos clássicos como Manic Miner e Jetpac eram carregados de fita cassete, e o ruído do carregamento era o hino não-oficial da programação doméstica.

  • O TK-85 tinha teclas firmes, de verdade — um luxo frente ao teclado de membrana dos modelos anteriores.

  • O BASIC era o idioma universal de quem acreditava que a imaginação podia caber em 48K.

  • E cada travamento no meio do LOAD era uma lição precoce sobre resiliência.

💾 Do 8 bits à nuvem

O TK-85 me ensinou muito antes de eu entrar no mundo do mainframe e, décadas depois, ver nascer a inteligência artificial.
Naquela tela de TV disputada pela família, eu aprendi o que significava falar com a máquina — não como servo, mas como cúmplice.

Hoje, quando vejo algoritmos escrevendo textos, interpretando imagens e criando mundos, lembro do meu TK-85.
Ele não tinha voz, não tinha rede, não tinha nada além de 48K de sonho.
Mas foi ali que o futuro começou a carregar — um LOAD longo, com chiado, mas inevitável.

☕ Epílogo

O TK-85 não era apenas um computador: era um rito de passagem.
Foi ele que me ensinou que o digital podia ser humano, e que cada linha de código era uma forma de poesia.
Ele roubava a televisão da novela, sim — mas devolvia algo muito maior: a sensação de que o impossível podia ser aprendido, tecla por tecla.

E talvez, no fundo, essa tenha sido a primeira forma de inteligência artificial que conheci:
a capacidade do ser humano de sonhar com a máquina e, ao sonhar, reinventar o próprio mundo.


Bellacosa Mainframe
☕ Porque toda máquina tem alma — e toda infância tem um terminal piscando em “OK”.