A internet ficou mais chata?
Censura, vigilância moral e o fim da autonomia digital**
Por muito tempo a internet representou o território da liberdade. Espaço onde se tropeçava no bizarro, no proibido, no criativo e no nonsense sem filtro. Nos últimos anos, entretanto, a sensação dominante entre muitos usuários é clara: algo mudou. Tudo parece altamente policiado. Há sempre alguém julgando, denunciando ou “ensinando o que é o certo”.
A pergunta surge com força:
por que a internet está mais chata e moralista?
Este post não busca respostas absolutas. O objetivo é mapear os elementos que explicam essa “nova ordem digital”.
1. Plataformas centralizaram o poder
A internet antes era fragmentada. Hoje, concentra-se em meia dúzia de aplicativos. Quem controla essas plataformas controla:
• o que pode ser dito
• o que pode ser visto
• o que pode ser monetizado
O algoritmo virou o verdadeiro editor-chefe do mundo. Ele decide o que ganha espaço e o que é enterrado no limbo do irrelevante. Isso gera a sensação de que há um “curador invisível” guiando nossas escolhas.
2. A monetização exige ambiente “seguro”
Publicidade teme polêmicas. Para proteger anunciantes, as plataformas implementam filtros mais rígidos. Conteúdos eróticos, violentos, politizados ou “tabu” sofrem desvalorização automática.
Resultado:
o conteúdo neutro e insosso é mais recompensado do que o autêntico e arriscado.
A criatividade perde para o medo de ser desmonetizado ou banido.
3. Novo puritanismo social
Mesmo sem leis diretas, a vigilância moral aumentou. Grupos organizados promovem cancelamentos e campanhas de linchamento simbólico. Certas opiniões deixam de ser “controversas” para se tornarem proibitivas.
Isso gera autocensura. O usuário passa a se policiar para evitar punição social.
4. Regulamentações estatais em expansão
Governos adotam legislações para combate a:
• desinformação
• ódio
• exploração
• crimes virtuais
Essa normatização surge de preocupações legítimas, porém cria efeitos colaterais. Para evitar problemas legais, empresas aumentam o bloqueio automático de temas sensíveis.
O risco é simples: no esforço para proteger, pode-se começar a tolher demais.
5. O algoritmo quer perfeição emocional
Plataformas associam “bem-estar” a ausência de desconforto. Qualquer conteúdo complexo, provocativo ou que exija reflexão pode ser interpretado como “negativo”.
Assim, a cultura da internet se infantiliza. O contraditório vira inimigo.
A máquina protege o usuário do mundo, mas também o protege de pensar.
O que realmente mudou
A internet não é mais o espelho da humanidade.
Ela se tornou o produto daquilo que empresas e comunidades acreditam que deve ser aceito.
Antigamente:
→ o usuário moldava a rede
Hoje:
→ a rede molda o usuário
Cada clique é avaliado.
Cada palavra é rastreada.
Cada desejo é classificado.
A autonomia dá lugar à curadoria forçada.
Conclusão
A pergunta do título talvez esteja mal formulada.
A internet não ficou necessariamente mais “chata”.
Ela ficou governada.
O espaço que antes era caos criativo agora opera sob:
• algoritmos que selecionam o que “pode”
• moralistas que policiam o que “deve”
• anunciantes que decidem o que “vende”
A liberdade existe… desde que dentro das regras do feed.
A era da internet anárquica terminou.
Vivemos agora na internet domesticada.


