🚗💨 O Fusquinha Vermelho na Washington Luís
Crônica Bellacosa Mainframe — Memórias de um Tempo em que Estrada Era Universo
Antes da internet, antes dos smartphones, antes até de você saber o que era um mainframe, existia o Fusquinha Vermelho 1960, abrindo caminho pelo interior paulista como uma nave estelar rubra rasgando o asfalto quente.
Aquela lataria tremendo, o motorzinho valente, o volante fino, o cheiro de gasolina e banco de curvim — tudo isso fazia parte de um protocolo de aventura que nenhum roteador de 2025 conseguiria replicar.
Motor superaquecendo pelo calor da estrada e o tempo de funcionamento.
E o palco?
A lendária Rodovia Washington Luís —
uma linha reta infinita, cortando o estado como um track contínuo de vida, poeira e descobertas.
🛣️ Quando a Washington Luís Era Universo Expandido
Nos anos 1970, estrada ainda era o desconhecido.
Poucos carros.
Muitos caminhões.
Retões infinitos.
Declives que davam a sensação de montanha-russa.
As famosas banguelas — aquele momento mágico em que o Fusquinha engatava ponto morto e se tornava uma embarcação livre no vento.
Ali, eu descobri que estrada não é caminho: é portal.
Cada viagem era um salto quântico:
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Ibitinga para comprar bordados,
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Urupês e Catanduva para ver família,
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São José do Rio Preto para primos e mais parentes espanhois
outras cidades para reportagens fotográficas do meu pai,
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e aquela imensidão do interior, salpicada de cafezais, canaviais e laranjais ondulando como mar verde.
🌾 Paradas Estratégicas: Os Rituais da Estrada
A cada trecho, havia um ritual:
**🟢 Necessidades fisiológicas?
A natureza sempre foi a primeira área de descanso.**
O Fusquinha parava na beira do cafezal, eu corria atrás de um arbusto qualquer, e pronto. Era o “banheiro do Brasil”.
🟠 Pequeniques improvisados em postos de estrada
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Sanduíche de pão com mortadela,
Tortas e bolos preparado pela minha mãezinha
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Guaraná quente,
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Formigas fazendo auditoria na toalha xadrez,
Laranjas doces e madurinhas apanhadas pelo caminho
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E aquele vento quente bagunçando cabelo, roupa e alma.
Era simples.
Era feliz.
🎠 Os Parquinhos do Interior — O Primeiro Parque Temático da Sua Vida
Os postos de serviço da época tinham parquinhos infantis que beiravam a engenharia experimental.
Escadas metálicas, balanços altos, brinquedos de giro capazes de lançar qualquer criança para outra linha do tempo.
E o mais lendário de todos: o robô gigante.
Me lembro dele, agora mesmo o pavor, a estrutura imponente como se fosse um mecha de anime, um Gundam feito de sucata.
Hoje, adulto, reconheço não era tão grande e assustador:
— Devia ter uns 5 metros.
Mas para o pequeno Bellacosa?
— Tinha 30 metros e olhava direto para sua alma.
Foi ali que vivi o grande encontro com o medo, o limite para o pequeno malabarista de muros.
Meu pai, paciente como um processador IBM de 2MHz, me colocou no colo e começou a subir a geringonça metálica.
Chegando lá em cima — no topo do mundo — o braço do robô era um escorregador gigantesco.
Olhei pra baixo.
As pernas tremem.
O coração trava.
A coragem falha no checkpoint.
E o berreiro começa.
Meu pai — herói, sysadmin e suporte emocional Level 99 — te leva de volta pelo caminho seguro, contrariado e durante muitos anos fui lembrado via bulling deste robo.
E assim, naquele dia, entendi duas coisas:
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Coragem não nasce pronta.
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Às vezes o herói é o pai que te desce devagar de um robô gigante, mesmo te zoando para o resto da vida pelo fato.
🏰 O Posto Castelo — Seu Primeiro Reino Imaginário
Outro marco da estrada era o mítico Posto Castelo.
Não era só um posto.
Era meu primeiro castelo de RPG.
Uma fortaleza de concreto na beira da rodovia, que para mim era:
O interior paulista, com seus castelos postos-de-gasolina, robôs de escada metálica e cafezais infinitos, foi o meu primeiro multiverso — antes de Tolkien, antes de Star Wars, antes de Shonen Jump.
🚗💖 Epílogo Bellacosa
Tudo isso aconteceu no velho Fusquinha Vermelho.
Ele era mais que carro:
Era nave espacial.
Era mula de carga.
Era dragão metálico.
Era cápsula de boas memórias.
E naquela Washington Luís dos anos 1970, onde cada reta parecia uma eternidade e cada descida era uma montanha-russa, aprendi o que é aventura, o que é movimento, o que é viver.
E hoje, ao lembrar dessas viagens, percebo:
A estrada não te levou apenas ao interior.
A estrada te levou para dentro de você mesmo.