📞 El Jefe Midnight Lunch — Um conto do Pequeno Trabalhador, Parte 4
“86-13-37: Quando a casa ganhou voz”
Por Bellacosa Mainframe
Estamos de volta ao Cecap no Quiririm em 1984.
O cheiro de tijolo novo, tinta fresca e esperança misturado a caótica mudança de Sampa a Taubaté. A família Bellacosa em modo multitarefa, estilo “z/OS em IPL pós-pânico”: todo mundo executando job, subtarefa, batch noturno, tarefa oculta… tudo ao mesmo tempo. Era reconstrução física, emocional e financeira — tudo junto, tudo misturado — depois do incêndio de 1983.
Foram meses puxados.
Arregaçamos as mangas, suamos, improvisamos, reciclamos e substituímos cacarecos velhos para devolver dignidade ao lar, meu pai com sua experiência em fazer funiliaria em seus automóveis velhos, usou massa plástica para reconstruir o gabinete da fiel TV CRT Preto e Branco Phico Ford. A geladeira parcialmente destruída, foi reformada tanto na lataria como no motor, e colocada em estado de novo, servindo nosso lar, por mais de uma década, sendo aposentada, quando eu ja trabalhava e comprei uma zero bala nas lojas Arapuam. Cada martelada era um checkpoint. Cada móvel novo (ou semi-novo) era uma vitória. E foi no meio desse caos organizado que surgiu a grande novidade.
Algo que, para muita gente hoje, não faz nem cócegas.
Mas pra nós… era a chegada do futuro.
O telefone. Nosso primeiro telefone. O lendário número 86-13-37.
Meus pais, sempre visionários, resolveram alugar um aparelho — porque na época telefone era quase um carro: caro, raro e valioso. A justificativa era prática: “pra divulgar trabalho, ligar pra clientes, fazer panfletagem…” — sim, panfletagem real, analógica, raiz, sem algoritmo, sem impulsionamento.
E adivinha quem ficou encarregado de distribuir spam manual, caixa postal por caixa postal, por todo o CECAP?
Sim, eu mesmo.
E o Celo, meu companheiro de aventuras.
Formávamos uma dupla dinâmica que hoje renderia um spin-off só nosso: dois moleques pedalando, colando panfletos, enfiando papel nos correios, correndo de cachorro, conversando com vizinhos… éramos quase um cluster de entrega distribuída, versão 1.0.
Mas nada — absolutamente nada — superava a sensação de ter um telefone em casa.
Parecia magia.
Era como se tivéssemos instalado um gateway para o mundo.
Com o 86-13-37, tudo mudou:
📞 falar com parentes distantes;
🏖 ligar para meus avôs Anna e Pedro na Praia Grande;
👋 ouvir histórias, novidades… e broncas;
🤣 ouvir as “historinhas” no 200-1234 (quem viveu, sabe!);
😂 aplicar e receber os primeiros trotes telefônicos — o proto-meme da década.
Era um universo novo.
Era CICS aberto, sessão iniciada, TSO READY.
E aí, abro um parênteses do século XXI, porque é impossível não comparar:
O telefone fixo virou fóssil.
Tenho um até hoje… não uso há séculos. Veio grudado no pacote da fibra ótica e ficou ali como quem guarda uma peça de museu — funcional, mas ignorado.
O celular então… virou mico.
Nos primórdios custava uma fortuna, cada impulso parecia preço de mainframe por MIPS. Depois virou SMS, depois WhatsApp, Telegram… e hoje quase ninguém usa pra ligar.
A ironia: as operadoras mataram o próprio produto com ganância e tarifas absurdas. Empurraram todos nós para alternativas mais baratas, eficientes e… livres.
O triste fim do telefone.
O outrora símbolo de status, comunicação e progresso… hoje é quase um ornamento.
Mas sem chatices, porque aqui é Midnight Lunch e nostalgia merece brilho:
Ainda lembro a emoção real, quase palpável, de ver aquele aparelho instalado na sala.
A liberdade que ele trouxe.
A sensação de que o mundo estava, literalmente, a um toque de distância.
O velho 86.13.37.
A primeira voz da casa renascida.
E um dia, prometo, conto a história da central móvel de telefonia, dos filamentos de cobre coloridos, das pulseirinhas estilosas feitas com restos de cabo multicolorido… um verdadeiro ASSEMBLER de memórias.
Porque cada fio daqueles carregava uma história.
E muitas delas ainda estão aqui, vivas, prontas pra ganhar outro capítulo.
Até a próxima chamada. 📞💾✨